domingo, 2 de abril de 2017

Lacaniana

Transposta a porta do restaurante, Lacan imobilizava-se e despojava-se ostensivamente da capa ou do sobretudo de twill que estendia ao acaso a quem passava, ainda que fosse um cliente! Depois ficava à espera, com aquele ar profundamente aborrecido e preocupado que afectava quando não se ocupavam dele imediatamente, até que o chefe-de-mesa ou o gerente do estabelecimento se precipitava.

Então, com um gesto lasso e como se não conseguisse aguentar-se mais tempo de pé, Lacan apoiava-se ao acaso a um ombro, soltando num tom dolente: «Caro, onde me senta?...» O pessoal, certamente guloso das suas boas gorjetas, apressava-se a conduzi-lo à «sua» mesa, em toda a parte e sempre a melhor.

Mal se sentava, inclinava-se para mim, rodeava com o braço as costas da minha cadeira e, virando a cabeça para a sala, lançava numa voz de estentor: «Está bem, minha querida? Se não, vamo-nos embora!...» Todos os olhares convergiam para nós! Pronto: éramos as vedetas!
Madeleine Chapsal na introdução de uma entrevista a Jacques Lacan, em 1957.

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