segunda-feira, 31 de julho de 2017

A menina está a repousar

E quando não está a rodar um filme? [...]
Dá passeios a pé.
Lê imenso, louca de felicidade. Da última vez que a vi, tinha acabado de ler um livro de Scott Fitzgerald: Tender is the night. Um dia, disse-me ao telefone que estava a fazer compotas com a Anna.
Num outro dia, tinha passado o tempo a dormir, por causa de um desgosto.
Ela tem necessidade de muitos tempos livres durante o dia. Precisa de telefonar a Jérôme quase todos os dias.
Se tem sono, é capaz de dormir, qualquer que seja a hora. Durante uma hora. Duas horas. Ou o dia inteiro. Anna desliga o telefone e fecha as portas dos corredores que conduzem ao primeiro andar.
– A menina está a repousar.
Marguerite Duras sobre Jeanne Moreau; Vogue, 1965.

O grande enigma

Ao longo da sua vida, a ideia da vida enquanto enigma foi crescendo?  
É agora maior do que nunca. Tudo me parece mais enigmático do que aquilo que eu pudesse sonhar que fosse. Estamos confrontados com qualquer coisa para a qual não há espécie nenhuma de resposta, ou se há é de uma outra natureza que as pessoas têm pudor de confessar, aquilo que não pode ser dito.
          (...) 
Nunca sabemos o que verdadeiramente nos move. Gostava de acabar os dias reconciliado com o mundo, e sobretudo saber que mundo foi este em que vivi e o que é a vida. Sei disso tanto agora que tenho quase cem anos como quando tinha dois anos.
Eduardo Lourenço em entrevista ao Ípsilon na passada Sexta-feira.

domingo, 30 de julho de 2017

Domingo no mundo (20)

Suzuki Harunobu, Menina em aguaceiro de Verão, 1765.

sexta-feira, 28 de julho de 2017

Dobrada à moda do Porto

A mim o que me mata,
querido efebo, digo-te:
desejo sem prazer,
versos sem graça ou ritmo,
e ceias só com chatos.
Arquíloco; trad. de Jorge de Sena.

quinta-feira, 27 de julho de 2017

Au pied de la lettre

Quelques mois après la parution de mon dernier roman, j'ai cessé d'écrire. Pendant presque trois années, je n'ai pas écrit une ligne. Les expressions figées doivent parfois s'entendre au pied de la lettre: je n'ai pas écrit une lettre administrative, pas un carton de remerciement, pas une carte postale de vacances, pas une liste de courses. Rien qui demande un quelconque effort de rédaction, qui obéisse à quelque préoccupation de forme. Pas une ligne, pas un mot. La vue d'un bloc, d'un carnet, d'une fiche bristol me donnait mal au coeur.
Peu à peu, le geste lui-même est devenu occasionnel, hésitant, ne s'exécutait plus sans appréhension. Le simple fait de tenir un stylo m'est apparu de plus en plus difficile.
Plus tard, j'ai été prise de panique dès que j'ouvrais un document Word.
Je cherchais la bonne position, l'orientation optimal de l'écran, j'étirais mes jambes sous la table. Et puis je restais là, immobile, des heures durant, les yeux rivés sur l'écran.
Plus tard encore, mes mains se sont mises à trembler dès que je les approchais du clavier.
J'ai refusé sans distinction toutes les propositions qui m'ont été adressées: articles, nouvelles de l'été, préfaces et autres participations à des ouvrages collectifs. Le simple mot écrire dans une lettre ou un message suffisait à me nouer l'estomac.
Écrire, je ne pouvais plus.
Écrire, c'était non.
Delphine de Vigan, D'après une histoire vraie.

terça-feira, 25 de julho de 2017

Røsas

P. S. Krøyer, 1893.

domingo, 23 de julho de 2017

Domingo no mundo (19)

Dennis Hopper, Jane Fonda (with bow & arrow), Malibu, 1965. 

sábado, 22 de julho de 2017

Máxima

De todas as armas, a mais difícil de manejar é o pau... de dois bicos.
Raul Brandão citando um amigo nas Memórias.

sexta-feira, 21 de julho de 2017

Fruta

Roderic O'Conor, Apples and Pear, 1892-1894.

quarta-feira, 19 de julho de 2017

A propriedade íntima

I thought about how fortunate she was to have something in her possession so sacred to her, something of such surpassing worth, that she wished to have it on when she met God.

domingo, 16 de julho de 2017

Domingo no mundo (18)

Eugène Boudin, Praia em Trouville, 1864-5.

sábado, 15 de julho de 2017

O stress cá dentro

We can never roll back the clock and reverse the effects of experiences, positive or negative, or the epigenetic change they produce. But we can move through those experiences to recovery and redirection; also, we can develop resilience through epigenetic change. New trajectories can engender compensatory changes in the brain and body over the life course.  
This perspective has led to a new field of study, called ‘life course health development’ (LCHD), spearheaded by Neal Halfon, a researcher and paediatrician at the University of California, Los Angeles. LCHD emphasises the importance of events prior to conception and in the womb because of their ability to generate epigenetic change; for the same reason, LCHD looks to the influence of income, education and abuse.  
In synch with this, our increasing knowledge of brain plasticity is giving rise to therapies based on self-regulation. These cognitive techniques, tapping mindfulness, breathing and more, can reduce toxic stress to at least more tolerable stress. Metabolic and cardiovascular health, not to mention memory and mood, can all be enhanced by a healthy diet, positive social interactions, adequate sleep, and regular physical activity. Government policies and business cultures that promote these values are key – whether dealing with housing, transportation, healthcare, education, flexible working hours or vacations, decisions at the top can dramatically impact healthspan of the population throughout life. Healthy behaviours and humanistic policies can ‘open a window’ of plasticity and allow the wisdom of the body to exert itself. With the windows open, targeted behavioural interventions – for instance, intensive physical therapy for stroke – can shape brain circuits in a more positive direction. Even if one has gotten off to a bad start in life, the trajectory can be changed by understanding how to lower the allostatic load and banish toxic stress.
Conclusão de Bruce McEwen, neurocientista que explica por que razão o problema e a solução para o stress estão no cérebro, aqui

sexta-feira, 14 de julho de 2017

Dinner at Kafka's

In 1923, Ben-Tovim visited Kafka and Dora Diamant in Berlin. She found them living in bohemian squalor, reading to each other in Hebrew and fantasizing about opening a restaurant in Tel Aviv, where Diamant would work in the kitchen and Kafka would wait on tables. “Dora didn’t know how to cook, and he would have been hopeless as a waiter,” Ben-Tovim observed.
Elif Batuman, Kafka’s Last Trial.

(Já estou a ver o corredor com a setinha «Sala de jantar na cave» e os comensais, kafkianos à força, a descer meia dúzia de degraus, curva à esquerda, a descer mais meia dúzia de degraus, curva à esquerda, a descer outra meia dúzia de degraus, etc..)

quinta-feira, 13 de julho de 2017

domingo, 9 de julho de 2017

Domingo no mundo (17)

Georg Flegel, Natureza morta com waffles, séc. XVII.

quinta-feira, 6 de julho de 2017

Driving the Beat Road

“I know that young people are striving for change, but it seems like they don’t know how to rebel or what to rebel against. The ones I know don’t have the fire in them that makes them dislike things. Everyone is amenable,” McClure says. “We’re living in an electronic world of communications that ontologically doesn’t exist, where we’re all one-dimensional. They’d be happier if they found their inner life, but they can’t. This is a flashing world of passion, which can be a beautiful thing and a terrible one.”
O Beat Michael McClure sobre o nosso tempo, na excelente reportagem de Jeff Weiss para o Washington Post.

quarta-feira, 5 de julho de 2017

Moçoila com um cigarro

Petr Zabolotskiy, 1850.

Bird lives.

Bird lives.  
This epitaph, written in chalk and paint on sidewalks and in subway tunnels after Bird died, at thirty-four, has the ancient emotional grain of a mouldering Roman wall inscription. It is a classic human cry against finality. What might we leave behind that will cling to earthly memory?  
Don DeLillo,  para a Vertigo.

terça-feira, 4 de julho de 2017

Guedes: o medo é uma cena que a ele não lhe assiste

Foi o caso agora de o nosso amigo Guedes, o Valente que se diz Pulido, ou ao contrário, vir anunciar uma grande nova. Abriu primeiro à cotovelada toda a massa literária portuguesa que disse ser uma farrapada de epígonos e de mediocralhada para os varredores municipais. E depois desta operação de limpeza, avançou ele. Mas como? Também escrevia romances? Ah, sim, evidentemente. Ele é que iria dizer como era. Ele é que sabia. Portanto um livro bom? Obviamente um livro óptimo. Literatura era com ele. Do lixo literário havia apenas um fragmento aproveitável. Mas não o entusiasmava. Ele é que conhecia a receita para um romance como devia ser.
Vergílio Ferreira, Conta-Corrente, Nova Série, Vol. II.

Simples

Uma casa é uma casa como uma rosa é uma rosa.
Armando Silva Carvalho & Maria Velho da Costa, O Livro do Meio,
Ed. Caminho.

segunda-feira, 3 de julho de 2017

My place, Portugal, 2017

Central Park, New York, 1961.

O braço direito

Havia um desfile na rua em que se gritava: “Matem os judeus!” A minha maravilhosa mãe apressou-se a fechar as cortinas, mas o meu pai disse: “Pelo contrário, eu quero ver isto. Mon petit, isto chama-se História.” Que coisa incrível para me dizer! Nunca voltei a ter medo. Por outro lado, nasci com uma deficiência severa [no braço direito] e a minha mãe não me deixou ser canhoto. Para ela, a autocomiseração era algo repugnante.

domingo, 2 de julho de 2017

Higiene*

Quem escreve pode separar de si pela escrita a sua razão de ser infeliz.
Vergílio Ferreira, Conta-Corrente, Nova Série, Vol. II.

* Escrever e publicar são coisas diferentes; às vezes publicar é só mandar a água suja da purga janela abaixo para cima de quem passe.

Domingo no mundo (16)

John Sloan, Yeats at Petipas, 1910-4.